Tão Tão Grande
Catarina Sobral
Orfeu Negro (2016)
“Tão Tão Grande" é o novo livro de Catarina Sobral, talvez não o seja no
formato, mas Tão Tão Grande na importância do tema que aborda.
A autora /ilustradora transporta-nos para um
quarto, onde são visíveis os brinquedos de criança, personagem protagonizada
por um hipopótamo que ao acordar se depara com a transformação do seu corpo.
Baseando-se na premissa kafkiana da transformação, com referências explicitas
no texto e nas guardas iniciais, a ligação ao personagem é dada numa ilustração
por nivelamento, com síntese de formas do meio natural em formas
geometrizadas.
As ilustrações a lápis de cera combinam com o
interessante contraste entre o branco e a cor, com um evidente equilíbrio nas
manchas de cor, pautadas por uma paleta que se aproxima do fauvismo.
A distorção das perspectivas proporcionam ao
leitor uma experiência imersiva e sensorial na atmosfera do cenário
afetivo do lar. O letring escrito à mão, ao invés de escrita digital, apresenta
uma coesão entre as palavras, sendo também a distribuição textual da narrativa
apelativa, variando o ritmo e entrosando-se com a ilustração resultado da
composição manual.
As sombras oferecem-nos um dramatismo
estético, estilizando a experiência próxima de cinema "noir",
o receio infantil do crescimento (como o de todas as mudanças) e da entrada na
aventura de uma nova fase do desenvolvimento humano. A sombra transporta-nos
para o desconhecido, o encoberto, um futuro que se inicia com dúvidas e
anseios. Fases do desenvolvimento humano que crianças e adultos vivenciam
revelando fragilidades e anseios. Ao contrário da transformação de Kafka, nesta
narrativa, Catarina Sobral, deixa o leitor surpreendido perante a confrontação
com o real e a estranheza do crescimento, dando-lhe uma viragem não só
narrativa como estética.
É esta mudança, que por oposição à metamorfose
aberrante e incomodativa de Kafka, o leitor mergulha no sentimento da voz que o
próprio desconhece, num corpo confrontado com a inevitabilidade mudança
da idade. Inversão também registada nas ilustrações das guardas finais.
Olhares atentos encontrarão leituras
simbólicas. Uma ode ao crescimento, numa narrativa deliciosamente
estética, recheada de arrefiares e de neologismos, característicos da
autora.
Elvira Cristina Silva
in: Newsletter Pró-Inclusão nº 100 - pág 8
Sem comentários:
Enviar um comentário